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O fim da civilização (por Felipe Sampaio)

Há males que vêm para o bem, a cada Civilização que se desfaz, as sociedades evoluem para modelos melhores

atualizado 05/10/2023 1:05

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Não se aperreie com o título acima, porque desde Adão e Eva o medo de um apocalipse tira o sono do ser humano. É bem verdade que a mudança climática deve ser levada a sério. Do jeito que a coisa vai, pode até comprometer a vida no planeta. Porém, nem sempre o fim de um ciclo representa em si uma má notícia.

Há outra hipótese de colapso menos distópica que pode atingir os sistemas atuais de organização política, social e econômica, bem antes de chegarmos a um cataclisma em escala global.

Se existe uma pergunta na história humana que possibilita incontáveis respostas, essa pergunta é: por que todas as grandes civilizações acabaram? Desde a Mesopotâmia, passando por Egito, Roma, Grécia e outras mais recentes, todas tiveram seu apogeu e findaram em decadência.

A nossa Civilização Globalizada Contemporânea não está livre do mesmo destino. Há vinte anos, Hélio Jaguaribe publicou Um Estudo Crítico da História (vol. I e II), onde analisou um fator comum às derrocadas das diversas civilizações.

Segundo o autor, todas as principais sociedades humanas da história sucumbiram à sua própria evolução! Apesar de ser um conservador, sua ideia lembra a dialética marxista, que entendia a sucessão dos regimes socioeconômicos em cada época como sendo um ciclo em que cada sistema, ao se desenvolver, cria as suas próprias contradições internas que o inviabilizarão.

Para Jaguaribe, a degradação das Civilizações não pode ser explicada simplesmente por guerras, invasões ou catástrofes naturais. No caso de Roma, por exemplo, a queda deu-se não por fatores externos, como os ataques dos ‘bárbaros’, mas pelo seu próprio êxito na expansão dos seus domínios, com a absorção de tantas culturas e etnias distintas, que o império transmutou-se por dentro e se fragmentou em reinos independentes mundo afora.

Nesse cenário, o modo de vida e de organização do atual capitalismo global tem sobrevivido a diferentes previsões de derrocada diante de fatores tão distintos como a ascensão do comunismo, a 2ª guerra mundial, a bomba atômica, o bug do milênio, a falência do Estado nacional ou a COVID-19.

O que nem Marx, nem Nostradamus, tampouco Antônio Guterres previram é que a mudança climática pode ser, na verdade, aquele fator interno de implosão da Civilização Pós-Industrial em que nós vivemos, sem necessariamente desembocarmos em um armagedon.

Ou seja, o aquecimento global pode ser o germe dessa transformação, gestado no próprio crescimento econômico globalizado, que se baseia na maximização do lucro e no estímulo do consumo (a despeito do meio ambiente e da desigualdade social).

Se isso for verdade, a tese de Hélio Jaguaribe se repete, com mais uma Civilização atingindo seu clímax e se desfazendo a partir de si própria. Resta saber que modelo nascerá em seu lugar.

Lembrando que há males que vêm para o bem, a cada Civilização que se desfaz, as sociedades evoluem para modelos melhores. A essa altura, é provável que a semente da próxima Civilização já esteja germinando e que, nesse mundo governado por velhos líderes, algum visionário mais jovem já consiga enxergá-la.

 

Felipe Sampaio: chefiou as assessorias dos ministros da Defesa (2016-2017) e da Segurança Pública (2018); cofundador do Centro Soberania e Clima; foi secretário-executivo de Segurança Urbana do Recife; atual diretor do SINESP no Ministério da Justiça e Segurança Pública.

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