“Até agora, ninguém sabe quanto vamos pagar de imposto”, diz tributarista

Apesar das dúvidas, estudo do advogado Luiz Bichara mostra que, após a reforma, alíquota brasileira sobre cosumo pode ser a maior do mundo

atualizado 13/07/2023 14:19

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imagem colorida advogado tributarista luiz gustavo bichara Divulgação

O advogado tributarista Luiz Gustavo Bichara tem participado ativamente das discussões sobre a reforma tributaria no Brasil, mas não sem grande espanto. Por quê? Diz ele: “Podemos ter a maior alíquota do mundo e pouca gente parece escandalizada com isso”.

Na avaliação de Bichara, há outros motivos para estupefação. “Os clientes perguntam: ‘Quanto vou pagar de imposto’. Eu respondo: ‘Não sei, ninguém sabe.” Ele observa que, na sua seleção de “dúvidas escandalosas”, cabe destacar o tamanho da carga tributária pós-reforma: “Ela é desconhecida por todos”, afirma. E existem outros problemas? Para Bichara, a resposta é, nitidamente, sim. E ele os expõe, a seguir, em entrevista ao Metrópoles.

Quais as principais críticas que o senhor faz à alíquota da reforma tributária?

Esse é um assunto grave e ainda mal-entendido pela sociedade. É preciso explicar que teremos três alíquotas: a federal, a estadual e a municipal. Somadas, elas darão o valor da alíquota que o Bernard Appy (secretário especial para a reforma tributária, do Ministério da Fazenda) há muito tempo fala que será em torno de 25%.

Como serão essas três alíquotas?

A composição seria de 9% para a União, 14% para os estados e 2% para os municípios. Daí, os 25%. Ocorre que o governo já mandou para o Congresso Nacional um projeto de lei, no qual estabelece uma alíquota de 12%. Então, mantidas as participações de estados e municípios, já estamos com 28%. E isso é o mínimo.

Seria um valor muito alto?

Essa seria a maior alíquota de IVA (Imposto sobre Valor Agregado) do mundo. E pouca gente parece estar escandalizada com isso. Estão todos dizendo que a mudança será maravilhosa. Mas a alíquota em países escandinavos, como a Suécia, a Noruega e a Dinamarca é de 25%. Na Hungria, que tem a maior do mundo, ela é de 27% (veja quadro no fim da entrevista).

A carga tributária vai aumentar com a reforma?

Na reforma, há um certo mito da neutralidade (quando a carga tributária é mantida no mesmo patamar da atual). Isso porque não existe, em nenhum lugar, garantia de que haverá neutralidade. O que temos é uma alíquota de referência. Ela terá, no momento da mudança dos tributos velhos para os novos, o tamanho necessário para manter o atual nível de arrecadação. Agora, não há nenhuma salvaguarda estabelecendo que, passado esse momento, os estados, os municípios e a União não possam aumentar o tributo. Esse ponto é crucial.

Nada impede essa possibilidade?

Existe uma garantia de neutralidade apenas até a virada do modelo (que deve ocorrer em 2033), mas, no minuto seguinte, a União, os estados e os municípios poderão fixar a alíquota que quiserem. Isso é muito preocupante.

Então, além de elevadas, no futuro, as alíquotas poderão ser diferentes entre estados?

Elas poderão ter diferenças dentro de um mesmo estado. Por exemplo, pode ser mais barato comprar um carro em São Paulo do que em Campinas. Assim, vamos correr o risco de manter, em alguma medida, uma espécie de guerra fiscal entre regiões, embora menor do que a existente hoje, na qual os estados competem entre si.

O que mais ainda o preocupa na reforma?

Há um problema gravíssimo. Hoje, nenhuma empresa no Brasil consegue simular qual será a tributação pós-reforma. Os clientes me ligam e perguntam: “Quanto vou pagar de imposto?”. Eu respondo: “Não sei, ninguém sabe.”

Por isso, o valor da futura alíquota já não deveria ser discutido desde já?

Não cabe à PEC (Proposta de Emenda à Constituição) fixar a alíquota. Isso é uma questão técnica, embora, curiosamente, já tenha acontecido no Brasil. A CPMF tinha alíquota prevista constitucionalmente, mas isso é só uma curiosidade. Cabe à Constituição delinear os contornos do tributo. Mas o fato é que, hoje, ninguém sabe qual será a carga tributária pós-reforma.

Mas a alíquota não poderia ser discutida paralelamente?

Sim, concordo. Porque, hoje, vemos as pessoas falando “eu sou a favor” ou “eu sou contra” a reforma. Mas ninguém exatamente como contra ou a favor do que está falando.

A reforma prevê exceções, com áreas que vão paga menos imposto. Isso é ruim?

Não vejo problema nas exceções. Acho que foi feita uma escolha legítima de duas alíquotas. Uma cheia e outra de 40% do valor da primeira. Isso é normal em todo o mundo. A Inglaterra tem três alíquotas, a França, cinco. Acho até desejável. Mas é importante que possamos debater a razoabilidade do critério de eleger as áreas que terão alíquotas diferenciadas. Por exemplo, atividades esportivas ficarão dentro da alíquota menor. Mas, para insumos relevantes como energia e telecomunicações, ela é cheia. Faz sentido um jogo de polo pagar menos tributo do que a energia elétrica?

Algum outro problema em relação à alíquota?

Existe outro jabuti. A reforma estendeu as imunidades tributárias a entidades religiosas. Antes, eram só os templos que não pagavam impostos. Agora, ela foi ampliada para associações que mantêm relações com a igreja. Outra questão difícil de entender é o silêncio sepulcral mantido pela Receita Federal em todo o processo. Ele é o único órgão que pode responder quanto vai ser essa alíquota e não está participando da discussão. Acho muito estranho que a Receita esteja calada.

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