Enfermeiro gay acusa centro islâmico de negar curso por homofobia

Centro islâmico na zona leste de São Paulo classifica como "infundada" a denúncia de homofobia feita à polícia por enfermeiro gay

atualizado 16/01/2023 22:52

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Douglas Zanin Homofobia Arquivo Pessoal

São Paulo – Um enfermeiro de 45 anos afirma ter sido vítima de homofobia dentro de um centro islâmico na zona leste da capital paulista, enquanto tentava se inscrever em um curso gratuito de árabe.

Douglas Zanin afirmou ao Metrópoles que foi ao Centro Islâmico Imam Al Mahdi de Diálogo no Brasil (Ciadb), no Belenzinho, na tarde da última sexta-feira (13/1), em busca de informações sobre o curso, divulgado nas redes sociais da entidade.

Ele disse ter sido atendido pelo xeque Mahdi Elah, que teria ficado empolgado com seu interesse pelo curso, mas depois mudou de postura quando soube que ele é gay.

“Ele demonstrou alegria quando eu disse que queria aprender árabe e também perguntou se eu tinha interesse em aprender mais sobre o livro sagrado [Alcorão]. Quando eu disse que conhecimento nunca é demais, ele ficou contente, colocando a mão no peito e falando para Deus me abençoar”, conta o enfermeiro.

Como no dia anterior havia acontecido uma festividade, o xeque teria proposto para Zanin retornar ao centro no fim da tarde, para um evento inter-religioso, para que ambos pudessem conversar melhor sobre os cursos. Antes que o enfermeiro fosse embora, o religioso teria lhe perguntado se ele era casado.

“Eu disse que não era casado, nem tinha filhos. Por fim, eu disse que era gay. Depois disso, ele falou se eu sabia que isso [ser gay] diante das leis de Deus estava errado e acrescentou que se eu me entregasse a Deus poderia até me casar [com uma mulher].”

Ainda segundo o enfermeiro, após revelar sua orientação sexual, o religioso teria falado para ele voltar outra hora. Quando retornou mais tarde ao centro islâmico, complementa, o xeque o ignorou. “Na verdade, ele me ignorou o tempo todo, até o fim do evento inter-religioso”, disse Zanin.

Após o fim do encontro, o enfermeiro disse ter tentado conversar com o xeque para pegar o exemplar do Alcorão que ele havia prometido e confirmar o horário do curso de idioma. Neste momento, segundo Zanin, o religioso conversou em árabe com outro homem e, em seguida, respondeu não haveria mais curso de idioma, alegando compromissos pessoais.

“Ele deixou muito claro que não me queria ali. É um absurdo como os esgotos da homofobia, do preconceito, foram abertos. Homofobia sempre existiu, mas não é seu gênero que define seu caráter”, desabafou o enfermeiro, que registrou um boletim de ocorrência de discriminação, por meio da Delegacia Eletrônica.

“Denúncias infundadas”

O centro islâmico afirmou, na tarde dessa segunda-feira, que as denúncias de Zanin são “infundadas” e “desconexas”, argumentando que elas “denigrem a imagem do centro e de um líder religioso”.

“Sobre ele ser homossexual, ser impedido de participar do curso, nem se tocou nesse assunto no dia, até porque estava tendo um encontro inter-religioso. Ele [enfermeiro] estava presente e o único ponto que ele tocou sobre foi o curso de árabe, somente isso e nada mais”, afirmou a entidade.

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Nos últimos 11 anos, ao menos 13 projetos de lei apresentados na Câmara dos Deputados e no Senado tentaram criminalizar ou endurecer penas para quem comete discriminação contra pessoas da comunidade LGBTI+. No entanto, nenhum deles avançou
Apesar de o artigo 5º da Constituição Federal determinar, em seu inciso XXXVI, que “a lei punirá qualquer discriminação atentatória aos direitos e liberdades fundamentais”, a homofobia não está, até hoje, na legislação penal brasileira
Por isso, a Associação Brasileira de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis, Transgêneros e Intersexos (ABGLT) e o Partido Popular Socialista (PPS) provocaram o Supremo Tribunal Federal (STF) através de duas ações, em 2012 e 2013, respectivamente, reivindicando a criminalização de condutas homofóbicas
Em 13 de junho de 2019, portanto, o Supremo permitiu a criminalização da homofobia e da transfobia. Por 8 votos a 3, os magistrados decidiram que atos criminosos contra homossexuais passariam a ser enquadrados na Lei 7.716 de 1989, mais conhecida como a Lei do Racismo
Dessa forma, “praticar, induzir ou incitar a discriminação ou preconceito” por motivo da orientação sexual de alguém é considerado crime
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Homofobia significa “aversão ou rejeição a homossexuais e a homossexualidade”, segundo o dicionário da língua portuguesa. Em outras palavras, é o termo utilizado para descrever o desprezo ou o ódio por quem não se identifica como heterossexual

Pyrosky/ Getty Images
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Nos últimos 11 anos, ao menos 13 projetos de lei apresentados na Câmara dos Deputados e no Senado tentaram criminalizar ou endurecer penas para quem comete discriminação contra pessoas da comunidade LGBTI+. No entanto, nenhum deles avançou

André Borges/ Metrópoles
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Apesar de o artigo 5º da Constituição Federal determinar, em seu inciso XXXVI, que “a lei punirá qualquer discriminação atentatória aos direitos e liberdades fundamentais”, a homofobia não está, até hoje, na legislação penal brasileira

Jon Vallejo/ Getty Images
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Por isso, a Associação Brasileira de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis, Transgêneros e Intersexos (ABGLT) e o Partido Popular Socialista (PPS) provocaram o Supremo Tribunal Federal (STF) através de duas ações, em 2012 e 2013, respectivamente, reivindicando a criminalização de condutas homofóbicas

Rafaela Felicciano/Metrópoles
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Em 13 de junho de 2019, portanto, o Supremo permitiu a criminalização da homofobia e da transfobia. Por 8 votos a 3, os magistrados decidiram que atos criminosos contra homossexuais passariam a ser enquadrados na Lei 7.716 de 1989, mais conhecida como a Lei do Racismo

Hugo Barreto/Metrópoles
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Dessa forma, “praticar, induzir ou incitar a discriminação ou preconceito” por motivo da orientação sexual de alguém é considerado crime

Carmen Martínez Torrón/ Getty Images
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A decisão visa punir ataques e ofensas contra a comunidade até que se edite uma lei acerca da questão. A pena prevista é de um a três anos, além de multa. No caso da divulgação do crime de homofobia em meios de comunicação, a pena será de dois a cinco anos, além de multa

Estudio13G/ Getty Images
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Atos homofóbicos, portanto, serão punidos dentro da Lei 7.716 de 1989, como um tipo de racismo até que o “Congresso Nacional aprove uma lei sobre o tema”

Giovanna Bembom/ Metrópoles
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Sendo assim, quando uma pessoa LGBTQIAPN+ é agredida fisicamente ou verbalmente em razão da sua orientação sexual, ela estará resguardada pelo artigo 20 da Lei do Racismo, que torna o crime imprescritível e inafiançável

Giovanna Bembom/Metrópoles

Caso anterior

O enfermeiro Douglas Zanin registrou no 24º DP (Ponte Rasa), em setembro do ano passado, um boletim de lesão corporal, ameaça e homofobia contra uma mulher, pertencente a uma igreja evangélica.

De acordo com o registro policial, a suspeita agrediu o enfermeiro, quando ele estava em uma padaria, no bairro Cidade Líder, zona leste de São Paulo. Além da violência física, ela teria chamado Zanin de “veado escroto” e  afirmado que “homossexual tem que morrer com dois tiros na cabeça.”

O caso está em andamento, já na esfera judicial.  A suspeita pelo crime não havia sido localizada até a publicação desta reportagem.

Como o Metrópoles mostrou na semana passadao, o número de casos de homofobia registrados no estado de São Paulo ao longo de dez meses de 2022 já supera o acumulado dos três anos anteriores, segundo levantamento feito pela reportagem com base em boletins de ocorrência.

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