Para juiz, escritor cometeu injúria ao acusar fraude em cota no TJDFT

O juiz também decidiu impedir que homem "vá a qualquer meio social gravar vídeos" chamando a mulher de "fraudadora de cotas raciais"

atualizado 06/01/2023 19:52

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Noemi da Silva Araújo Reprodução

De acordo com o juiz Matheus Stamillo, o escritor e digital influencer Adalberto Neto cometeu injúria ao acusar a servidora Noemi da Silva Araújo, 21 anos, de ter fraudado o sistema de cotas para negros no concurso público para o Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Terrotórios (TJDFT). O magistrado também impediu, judicialmente, que o homem “vá a qualquer meio social gravar vídeos” chamando a mulher de “fraudadora de cotas raciais”.

“O requerido [Neto] poderia tecer sérias crítica ao sistema de autodeclaração ou do próprio sistema legal de cotas raciais, ou mesmo ao método adotado pelo TJDFT ou pela Fundação FGV para considerar a autora parda, contudo, preferiu tecer uma característica negativa a autora, chamando-a de fraudadora, cometendo, contra ela, injúria”, indicou o juiz.

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Adalberto Neto usou mídias sociais para expor caso de Noemi Araújo

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Noemi teve resultado do processo de heteroidentificação negado e entrou com recurso contra decisão da banca do concurso

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Adalberto parabenizou a jovem com ironia depois de saber que ela teve o recurso aprovado

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Noemi ocupava cargo de técnico judiciário e assumiu, então, a vaga de analista

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Influenciador argumentou que ela nunca teria sofrido racismo na vida

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Desde o ocorrido, Noemi tinha optado por não dar entrevistas

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A decisão, publicada na tarde desta sexta-feira (6/1), estende os efeitos de liminar anterior, que ordenava Neto apagar os vídeos publicados sob multa diária de R$ 5 mil. O homem excluiu as publicações.

Segundo o magistrado, o escritor e nenhum órgão de fiscalização “postulou um mandado de segurança ou uma ação civil pública para anular o certame ou mesmo tentar suspender a posse da autora” anteriormente. Stamillo ainda afirma: “Poderia o requerido [Neto] fazer, uma vez que é respeitado no meio social como ativista em defesa das pessoas negras”.

“No entanto, acredita ele que é mais fácil postar vídeo em sua rede social acusando a autora de fraude quando não existe qualquer ato de fraude alegado ou comprovado contra ela, ao invés de agir contra o concurso que homologou sua aprovação”, continuou.

O juiz, porém, afirmou que não poderia obrigar o escritor “a deixar de publicar vídeos de reportagens que forma feitas por outros órgãos da imprensa falada e escrita acerca da forma que a requerente foi aprovada, porque a partir do momento em que ela optou por se inscrever no concurso em cota racial sabia do risco de tal fato ser criticado, devendo saber lidar com essa questão social”.

Entenda o caso

Noemi da Silva Araújo, 29 anos, foi aprovada no concurso do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios (TJDFT) como uma candidata negra para o cargo analista judiciário. O caso ganhou repercussão após viralizar nas redes sociais com a publicação de um escritor, criticando o método de ingresso por cotas adotado por Noemi. A postagem de Adalberto Neto mostra diversas fotos da jovem, acusada de fraudar o sistema para ser nomeada.

No resultado provisório de heteroidentificação, procedimento complementar à autodeclaração de pertencimento étnico-racial, Noemi teve a declaração negada. Após entrar com recurso administrativo, a mulher foi aprovada de forma definitiva. Os procedimentos são organizados pela Fundação Getulio Vargas (FGV), que formava a banca examinadora do concurso.

Noemi da Silva foi nomeada em novembro de 2022 para o caro com remuneração inicial de R$ 12.455,30. Ela já era técnica judiciária no tribunal anteriormente.

Em publicações no Instagram, Adalberto Neto afirmava: “Pra você, pessoa preta, de verdade, que perdeu essa vaga pela fraude dela, pedras no caminho e brancos que não respeitam a nossa existência vão existir sempre. Mas cabe a nós a resistência, a insistência, a luta. Uma hora a palhaçada vai acabar e seremos nós a rir por último”.

TJDFT e da FGV

No final da tarde de quarta-feira (04/01), o TJDFT publicou nota afirmando que “tanto a autodeclaração quanto a heteroidentificação não são realizadas pelo Tribunal”. O órgão também indica que “tampouco os recursos são julgados pelo TJDFT, sendo competência da própria banca contratada”.

“O Tribunal recebe a listagem, com a classificação obtida pelos candidatos, e promove a nomeação, seguindo, rigorosamente, a ordem classificatória. Não cabe ao Tribunal discordar dos critérios da FGV para promover a eliminação sumária de uma candidata, autodeclarada parda perante a banca contratada, conforme já decidiu o CNJ em caso análogo”, diz a nota.

O documento ainda esclarece que já foram requisitadas informações complementares à FGV, sobre os critérios de julgamento do recurso da candidata.

A Fundação Getulio Vargas indicou que seu posicionamento já estava presente na nota do tribunal e que, por enquanto, não haverá outra manifestação da fundação.

Nota de defesa de Noemi

“Foi com grande consternação que recebi a notícia de que minha imagem estava sendo exposta de maneira vexatória e irresponsável pelo autor das publicações que viralizaram na internet na data de ontem (03.01.23)

Aparentemente o autor da publicação desconhece a Lei de Cotas, e todo o procedimento adotado pelo TJDFT para garantir que a lei seja cumprida.

A referida lei n • 12.990/2014 dispõe que cotas raciais em certames públicos serão concedidas à pessoas de classificação negra-pretas e negro-pardas, na ultima, me incluo, com base na classificacao do IBGE.

Sou servidora pública federal de carreira do referido órgão público desde 2017, e fui aprovada no concurso para analista judiciário em 2022, e tomei posse em dezembro desse mesmo ano. Passei por todo o processo de verificação de enquadramento na política de cotas de forma legal e idônea, dentro dos processos previstos em Lei e na Constituição Federal.

Não fosse suficiente, o autor, que desconhece minha história e minha vivência, ainda me acusou de cometer o crime de fraude, questionando, inclusive, a idoneidade da banca avaliadora do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios.

Em nenhum momento fui procurada pelo autor das postagens sobre o conteúdo que seria veiculado, sobre a utilização da minha imagem, a de meus familiares e a do meu namorado.

Após a publicação eu fui xingada, atacada, tive minhas fotos e redes sociais expostas, sofri ameaças à minha integridade física e estou tendo que lidar com a exposição dos meus pais e do meu namorado. Tudo isso me abalou profundamente.

A política de cotas é fundamental no contexto socioeconômico atual, tanto para fins de reparação histórica, como também para garantir que pessoas pardas e negras assumam o seu lugar de direito na sociedade. Todos devemos lutar por um mundo onde não haja nenhum tipo de preconceito.

Desde sempre eu me vejo como mulher parda, e me declaro como tal muito antes do advento da Lei de Cotas.

A minha autodeclaracaco, firmada nas minhas origens de anscestralidade e caracteristicas fisicas, pode ser confirmada pelos assentamentos do Instituto de Identificacao da Policia Civil (II) do Distrito Federal (2007).

Não pode o “tribunal” da Internet invalidar a identificação de uma mulher como foi verificado no vídeo veiculado. Desde a publicação do vídeo, foi desencadeado um verdadeiro linchamento em praça pública contra mim. Importante ressaltar, inclusive, que já há decisão judicial em caráter liminar ordenando a retirada do conteúdo pelo autor e de suas respostagens (processo n. 0700133-66.2023.8.07.0020).

Por fim, comunico que todas as medidas legais cabíveis estão sendo tomadas contra o autor, e contra todos aqueles que divulgaram o referido vídeo. Todos aqueles que, de forma irresponsável, divulgaram tais informações, estarão sujeitas ao crivo da Lei”.

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