Comunidade de indígenas refugiados denuncia fome e abandono em Brasília

Os Warao Coromoto vivem numa região rural do Paranoá e precisam pedir dinheiro nas ruas para sobreviver

atualizado 13/03/2023 8:59

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Warao Coromoto - Metrópoles Hugo Barreto / Metrópoles

O abandono dos povos indígenas não atingiu apenas os Yanomamis. A 55 quilômetros do Palácio do Planalto e do coração da capital do país, os Warao Coromoto sofrem com fome e doenças em um terreno alugado na região rural do Café sem Troco, no Paranoá. Para sobreviver, eles dependem de doações e mendigam pelas ruas do Distrito Federal.

“Crianças choram de fome aqui, queremos ter a nossa autonomia. Atualmente, estamos consumindo água de poço e devemos R$ 5 mil de energia”, relatou o cacique Miguel Antônio Quijada Lorenzano, de 44 anos.

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Abandonada, a comunidade indígena Warao Coromoto enfrenta fome e doenças

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Os Warao Coromoto sonham e batalham pela autonomia financeira

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A comunidade elaborou um projeto para conquistar a independência econômica

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No entanto, o GDF suspendeu o projeto

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O alimento é escasso e a comunidade depende de doações para sobreviver

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As famílias priorizam a alimentação das crianças, mas mesmo assim a quantidade é insuficiente

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Os poucos alimentos disponíveis são cozidos na lenha

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A comunidade indígena sobrevive em um terreno no Café sem Troco

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O cacique Miguel luta e sofre pela comunidade Warao Coromoto

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Segundo o cacique, sem o socorro financeiro, os Warao Coromoto correm o risco de ser despejados e voltar a viver nas ruas

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Para a esposa do cacique, Elisa Galan Zapata, de 39 anos, ver as crianças com fome é uma grande dor

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Ismênia Del Vale Sanchez, de 34, é presidente da associação Comunidade Warao Coromoto. "Temos muitas crianças com diarreia, vômitos e febre"

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As mulheres da comunidade indígena são hábeis artesãs

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Um dos principais sonhos das mulheres é produzir e vender peças de artesanato. "Meu sonho é seguir adiante junto com a minha comunidade, como mulher e artesã", disse Ismênia

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Segundo Gilberto Portes, o projeto de autonomia estava pronto e contava com R$ 500 mil em emendas parlamentares

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Sem banheiros, os indígenas tomam banho à céu aberto

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A água é colhida em um poço

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A comunidade indígena chegou ao DF em 2018

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A arepa é o principal prato dos Warao Coromoto

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O alimento pode ser consumido puro ou com carnes

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A comunidade tem 126 pessoas, entre homens, mulheres, crianças e idosos

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A comunidade indígena veio para o DF na esperança de um futuro melhor

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A comunidade indígena venezuelana recebeu barracas da Acnur

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O drama dos Warao Coromoto levantou a questão da falta de uma política pública para tratamento de comunidades indígenas migrantes ou refugiadas

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Refugiada da Venezuela, a comunidade Warao Coromoto tem 31 famílias distribuídas em 126 pessoas. Desse total, 54 são crianças. Além da falta de comida, a aldeia não conta com banheiros. Necessidades básicas são feitas em matagais na vizinhança e banhos somente com água de poço.

Castigados por condições insalubres, os Warao Coromoto adoecem frequentemente. Febre, diarreia e vômitos atormentam as crianças, semanalmente. Na quinta-feira (9/3), após sofrer dias com dores causadas por complicações pós-cirúrgicas, um dos membros da comunidade foi socorrido de ambulância para um hospital da rede pública.

Segundo o cacique Miguel, o Governo do Distrito Federal (GDF) abandonou a comunidade. Os Warao Coromoto recebiam apoio para alimentação e aluguel social. No entanto, sempre sonharam com autonomia financeira. As mulheres são artesãs habilidosas e os homens têm aptidão para a produção rural.

Em 2022, em parceria com a instituição Aldeias Infantis SOS Brasil, eles apresentaram um projeto de autonomia e infraestrutura para a Secretaria de Desenvolvimento Social (Sedes). A proposta foi aprovada e recebeu uma emenda de R$ 500 mil do deputado distrital Fábio Felix (PSol). Mas, ao final de 2022, de acordo com o líder indígena, a pasta suspendeu a iniciativa.

“Infelizmente, o GDF lavou as mãos”, lamentou o cacique. Sem dinheiro, os Warao Coromoto correm o risco de ser despejados em breve. “O governo não entende a nossa dor. Para dar o que comer às nossas famílias, temos de sair às ruas e pedir dinheiro”, lamentou.

Degradação

Gilberto Portes de Oliveira, 54, é o administrador voluntário da comunidade Warao Coromoto. “Eles estão correndo risco. As crianças caminham para um processo de desnutrição generalizada”, alertou.

Do ponto de vista de Portes, o drama dos Warao Coromoto levantou outra questão: o Brasil ainda não tem uma política consolidada para tratar os indígenas migrantes. Atualmente, são tratados como refugiados. Para o administrador voluntário, esse grupo deveria ser inserido na política nacional indigenista.

Nossa senhora

Pelas contas de Portes, a partir 2015, cerca de 5,8 mil membros da etnia Warao começaram a buscar refúgio no Brasil. Em 2018, a comunidade Coromoto, batizada em referência à padroeira da Venezuela, Nossa Senhora de Coromoto, veio para o DF.

Inicialmente viviam nas ruas, pedindo ajuda. Em 2019, conseguiram um espaço em São Sebastião, graças a um trabalho do GDF e da Arquidiocese de Brasília. No entanto, não se adaptaram. Na sequência, criaram uma associação e conseguiram alugar o terreno, no Café sem Troco, de um empresário humanitário.

Segundo Portes, recentemente, a Agência da ONU para Refugiados (ACNUR) doou barracas para a comunidade. No entanto, sem apoio financeiro para a autonomia, dificilmente conseguirá se manter por mais de 90 dias nas condições atuais.

Arepa

A principal fonte de nutrição dos Warao Coromoto é a arepa, uma espécie de bolo de milho. O alimento pode ser cozido ou assado. Além disso, é possível misturá-lo com frango, carne ou peixe. Outro prato típico é a torta de arina, feita com farinha de trigo.

O Metrópoles visitou a comunidade indígena na manhã de sexta-feira (10/3). Os Warao Coromoto tinham uma quantidade escassa de alimentos à disposição, como farinha, macarrão e poucos frangos.

O deputado Fábio Felix é presidente da Comissão de Direitos Humanos da Câmara Legislativa (CLDF). Além de cobrar providências do GDF, ele pretende pedir investigação por parte do Ministério Público e acionar os ministérios dos Direitos Humanos e da Justiça.

“É estarrecedora a negligência do GDF com os indígenas Warao. Estão sendo vítimas de todo tipo de precarização e abandono. Recebemos relatos de desnutrição – inclusive de crianças e idosos –, doenças graves com recusa de atendimento por parte da Secretaria de Saúde, entre outras violações intoleráveis de direitos humanos”, disse o parlamentar.

Consternados

O Departamento de Migrações (Demig), da Secretaria Nacional de Justiça do Ministério da Justiça e Segurança Pública, afirmou que acompanha o caso. Segundo a pasta, todos os indígenas na comunidade estão em condição migratória regular e com documentação em dia.

O órgão federal ficou surpreso com a suspensão do apoio aos Warao Coromoto. “Mesmo não sendo competência direta do Demig, estamos consternados com a situação e contatando as autoridades competentes para realizar um plano de ação conjunta a fim de reverter a situação”, destacou o departamento.

Sedes

A Sedes negou o abandono. Confirmou a tramitação do projeto de autonomia, contudo afirmou que o processo foi interrompido porque a organização da sociedade civil que representava a comunidade teria desistido. Segundo a pasta, a comunidade está inserida nos programas sociais do GDF. Também argumentou que apoia a Acnur na instalação de barracas para os indígenas.

Leia a nota na íntegra:

A Secretaria de Desenvolvimento Social informa que no segundo semestre de 2022, a Comunidade Warao Coromoto apresentou proposta de projeto de fortalecimento da comunidade, de construção de autonomia e inclusão produtiva. Para viabilizar o financiamento, a própria comunidade apresentou uma organização da sociedade civil como representante para a execução do projeto e essa organização recebeu a destinação de uma emenda parlamentar no valor de R$ 500 mil. Contudo, quando estava em processo final de firmação da parceria para a execução do projeto, a mencionada organização que representava a comunidade desistiu do projeto, inviabilizando a execução da emenda.

A Secretaria apoiou a comunidade na busca de uma nova organização e realizou tratativas com a Câmara Legislativa para a viabilização de uma nova emenda parlamentar. Contudo, não houve tempo hábil para a realização de todos os trâmites necessários para a execução da emenda parlamentar e a firmação da parceria antes do encerramento do exercício financeiro.

A comunidade Warao Coromoto é acompanhada pela política de assistência social, de modo que todas as famílias estão inseridas no Programa Bolsa Família e no Programa Prato Cheio, recebendo verbas mensais para aquisição de alimentos. Em 2022, atuando em conjunto com a então Secretaria do Trabalho, 24 waraos foram incluídos no Programa Renova DF, no qual receberam formação profissionalizantes e bolsas de capacitação. Nesse momento, nove membros da comunidade também estão inseridos no Programa e recebendo bolsas de capacitação. A Secretaria de Saúde também realiza acompanhamento regular da comunidade e a Regional de Ensino do Paranoá criou uma turma multisseriada específica de atendimento da comunidade Warao em processo de pactuação com a comunidade e com a Promotoria de Educação.

Cabe destacar, ainda, que a comunidade também é acompanhada pelo Alto-comissariado das Nações Unidas para os Refugiados (Acnur), o qual, em parceria com a Sedes, instalou módulos de moradia emergenciais na comunidade para garantir melhor habitabilidade.

Negativa

Questionados novamente pelo Metrópoles, os Warou Coromoto afirmaram que não desistiram do projeto de autonomia em momento algum. A comunidade indígena confirmou a participação de alguns membros em programas de capacitação e o recebimento do cartão Prato Cheio. No entanto, argumentou que o valor do benefício é insuficiente para o sustento e a segurança alimentar das famílias.

Educação

Após a publicação da reportagem, no domingo (12/3), a secretária de Educação do DF, Hélvia Paranaguá, procurou o Metrópoles para informar que a pasta possui um projeto para matricular todas as crianças da comunidade indígena e faz o acompanhamento educacional dos pequenos.

Segundo a secretária, a pasta de Educação oferece salas para todas as crianças da comunidade na escolas Morro da Cruz (São Sebastião) e Café sem Troco (Paranoá). “Elas vão de segunda a sexta para a escola. São alimentadas na escola”, declarou Paranaguá.

A pasta oferece uma professora de espanhol e uma educadora com mestrado em educação indígena. Hélvia disse que o vice-cacique e a esposa foram contratados como educadores sociais voluntários, para ajudar como intérpretes. A secretária destacou que todo o trabalho é acompanhado pelo Ministério Público do DF e Territórios (MPDFT).

Funai

O Metrópoles entrou em contato a Funai e o Ministério dos Povos Indígenas sobre a situação. O espaço permanece aberto para eventuais manifestações.

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