Na teoria, muita gente sabe que fetiches sexuais, por mais inusitados que sejam, podem ser perfeitamente saudáveis desde que praticados de forma totalmente consensual e não gere sofrimento a ninguém. Na prática, porém, ainda há preconceito e disseminação de ódio contra pessoas que decidem assumir gostos diferentes no sexo.
No último fim de semana, o ator Fernando Mais foi exposto nas redes sociais após um internauta descobrir que ele era a pessoa por trás do pseudônimo Gustavo Scat, autor do livro Quero Scat – o sexo com cocô, mijo e peidos. No Twitter secundário, Fernando compartilhava sobre o fetiche e divulgava seu livro, que foi escrito a partir de um antigo blog de mesmo nome.
Após o dossiê viralizar, Fernando viu sua vida íntima exposta e misturada à sua carreira profissional. Junto a isso, passou a receber diversas mensagens de ódio e ameaças. Em suas redes sociais, o ator chegou a afirmar que sua saúde mental não estava muito bem, mas que tentaria “fazer do limão, uma limonada”.
Em entrevista à Pouca Vergonha, Fernando questiona a hipocrisia e falso moralismo das pessoas, que parecem ter os valores invertidos ao verem mais problema em um gosto pessoal do que em ataques contínuos a uma pessoa por conta de algo que está sendo feito em sua intimidade.
“Sim, tenho um fetiche, e ele não é ilegal. Tenho três regrinhas na minha vida, que são ‘com consenso, bom senso e dentro da lei, seja feliz’. Eu entendo as pessoas acharem nojento, mas estou recebendo mensagens de pessoas dizendo que vão me matar se me encontrarem na rua, e isso é assustador. Isso sim é doentio”, diz.
Com toda a repercussão, Mais considera que, de agora em diante, tem a missão de reverter sua imagem e mostrar que é um bom ator e tem caráter e vida pessoal além dos fetiches. Sobre o scat (que, vale ressaltar, nada tem a ver com excrementos animais), Fernando ressalta: está tudo bem ser diferente.
“Está tudo bem. Se aceitem, sejam felizes, taquem o f*da-se para os hates. Vão criticar qualquer decisão da nossa vida, de qualquer forma. Se você tem um fetiche, qualquer que seja, busque, pesquise, se aceite. Porque vale muito a pena, e estou falando isso no pior momento da minha vida.”
O preconceito com fetiches
De acordo com o terapeuta sexual André Almeida, esse preconceito vem sendo construído ao longo de muitos anos, desde que se criou uma “norma” para o sexo. “Desde muito tempo começaram a ser criadas regras sobre o que é certo ou errado no comportamento sexual. Com isso, pessoas que saem daquele padrão de ‘normalidade’ passam a ser consideradas não saudáveis, aberrações, pessoas que precisam de tratamento”, explica.
Vale lembrar que está longe de ser a realidade. O psicólogo reforça que todo e qualquer comportamento sexual que tenha consentimento, não faça mal a ninguém e não coloque o bem-estar de nenhum dos envolvidos em risco é um comportamento normal e saudável. “São simplesmente pessoas que aproveitam seu prazer de uma forma que sai do que foi convencionado”, afirma.
Apesar de todo o preconceito, com a internet e a disseminação de informações, fetichistas puderam identificar outras pessoas com os mesmos gostos e se organizar. Foi o caso de Fernando Mais, que de 2017 a 2022 publicou textos em seu blog e ajudou diversas pessoas com o mesmo fetiche a se aceitarem.
“Esses movimentos sociais de aceitação e colocação social fazem com que as pessoas tenham cada vez mais visibilidade e aceitação. Claro, é um processo longo, ainda tem muito preconceito. Com o tempo, a gente vai conseguir um maior espaço para todos”, diz.