A entrevista do presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, no programa Roda Viva foi de causar pena. Na linha “só no Brasil”, é só no Brasil que se pode ter pena de um presidente de banco central. O coitado está sendo acusado de fazer o trabalho dele e, por isso, teve de ir à televisão explicar-se, a fim de tentar amansar o presidente da República, o brilhante economista Luiz Inácio Lula da Silva.
Os jornalistas o questionaram até sobre o fato de ele ter usado uma camisa da seleção brasileira no dia da eleição, como se fosse crime Roberto Campos Neto ter votado em Jair Bolsonaro. Como se o presidente do Banco Central fosse juiz e não pudesse manifestar preferências eleitorais. Ele também foi inquirido por ter trocado mensagens num grupo de WhatsApp com ex-ministros do governo anterior. Como se o presidente do Banco Central estivesse impedido de conversar num grupo privado de aplicativo sobre assuntos que não firam a integridade da sua função. A única escorregada de Roberto Campos Neto não foi assunto no programa: o fato de ele ter perguntado ao banqueiro André Esteves, em outubro de 2021, ainda no governo anterior, sobre qual seria o limite para a queda da taxa de juros.
Roberto Campos Neto disse que quer trabalhar juntamente com o governo para combater a inflação e afirmou que gostaria de conversar com Lula sobre políticas sociais. “Esse cidadão” foi bastante amigável, inclusive porque, além de ser moço educado, a banca não quer que ele seja saído de jeito nenhum, com medo disto aqui virar uma Argentina. Um dia depois, em fala no BTG Pactual, banco de André Esteves, Roberto Campos Neto chegou a afirmar: “É justo questionar juros altos e é importante alguém fazer isso no governo. Faz parte do jogo e do equilíbrio natural. É trabalho do Banco Central melhorar a comunicação sobre suas decisões. Eu reconheço que poderia ter feito isso de forma mais frequente e didática”. Pode ser até que, diante de tantas demonstrações de humildade, o brilhante economista do Palácio do Planalto arrefeça os seus ímpetos contra o presidente do Banco Central e o mercado se acalme um pouco nos próximos tempos.
Inimigos, porém, jamais serão amigos. Repito o que já disse aqui no Metrópoles: Lula quer que Roberto Campos Neto vaze. A menos que a autoridade monetária vire tchutchuca do presidente da República e aceite baixar a taxa de juros a níveis irresponsáveis, o que na prática significaria abolir a autonomia que lhe foi conferida por lei, a campanha violenta contra Roberto Campos Neto prosseguirá. Ontem, mal terminou a entrevista no Roda Viva, a matilha petista nas redes sociais foi solta para mordê-lo. Antes, na comemoração dos 43 anos do PT, Lula terceirizou os ataques : coube a Gleisi Hoffmann negar a existência de problema fiscal no país e esbravejar que o presidente do Banco Central “corrobora com a mentira, impondo um arrocho de juros elevados”. Terraplanismo, mas com método.
Na verdade, Roberto Campos Neto tem um pecado original para Lula e todos os petistas: foi nomeado por Paulo Guedes/Jair Bolsonaro. Mesmo bancando o tchutchuca, será sempre um estranho no ninho. Se conseguir completar o mandato no BC, espero que esse segmento de inferno não lhe deixe muitas sequelas.
