Em discurso de abertura do encontro com 10 presidentes da América do Sul, nesta terça-feira (30/5), o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) afirmou que é preciso “redefinir uma visão comum e ter visões concretas para o bem-estar das nossas populações”. Também defendeu que a ideologia fez a região deixar de lado a integração e se dividir.
O mandatário brasileiro recebe líderes de todos os países latino-americanos para cúpula no Palácio Itamaraty, em Brasília. Em fala inaugural, Lula pediu que os representantes da região firmem um compromisso para “reavivar a integração” no continente.
“É com grande alegria que recebo meus amigos presidentes sul-americanos. Agradeço muito que tenham atendido a este chamado e o esforço que fizeram para estar aqui. O que nos reúne hoje em Brasília é o sentimento de urgência de voltar a olhar coletivamente para a nossa região. É a determinação de redefinir uma visão comum e relançar ações concretas para o desenvolvimento sustentável, a paz e o bem-estar de nossas populações”, apontou Lula.
De acordo com o presidente brasileiro, durante muitos anos, a América do Sul diminuiu a população que passava fome e os conflitos sociais. “Estimulamos o diálogo e a cooperação para fazer chegar a milhões de sul-americanos, de forma efetiva, os benefícios da cidadania”, pontuou o mandatário.
“As reuniões de cúpula com os países árabes e com os países africanos ajudaram a definir um perfil de relacionamento externo da América do Sul. Foram feitos formidáveis para uma região herdeira do colonialismo e marcada por graves formas de violência, discriminação de gênero e racismo”, prosseguiu.
Lula citou o governo de Jair Bolsonaro, a quem chamou de “negacionista”. “Nosso país optou pelo isolamento do mundo e do seu entorno. Essa postura foi decisiva para o descolamento do país dos grandes temas que marcaram o cotidiano dos nossos vizinhos”, continuou.
Segundo o presidente, esse tipo de gestão no Brasil e em outros países fez com que a América do Sul “interrompesse esforços de integração”. “Deixamos que ideologias nos dividissem. Abandonamos canais de diálogo e mecanismos de cooperação. Com isso, todos perdemos”, salientou.
No discurso, Lula ainda ressaltou a vontade do país de retomar instrumentos de integração regional, como a União de Nações Sul-Americanas (Unasul) e a Comunidade de Estados Latino-Americanos e Caribenhos (Celac).
“A América do Sul tem diante de si, mais uma vez, a oportunidade de trilhar o caminho da união. E não é preciso recomeçar do zero. A Unasul é um patrimônio coletivo. Lembremos que ela está em vigor: sete países ainda são membros plenos. É importante retomar seu processo de construção, mas, ao fazê-lo, é essencial avaliar criticamente o que não funcionou e levar em conta transições”, disse.
Propostas em debate
Na fala inaugural, além das pautas trazidas pelos demais presidentes sul-americanos, Lula propôs uma lista de iniciativas voltadas para a reintegração das nações reunidas. Entre elas, a criação de uma moeda referência comum para o comércio, reduzindo a dependência de câmbios extrarregionais.
Veja a lista de proposições citada por Lula:
- colocar a poupança regional a serviço do desenvolvimento econômico e social, mobilizando os bancos de desenvolvimento, como a CAF, o Fonplata, o Banco do Sul e o BNDES;
- aprofundar a identidade sul-americana também na área monetária, mediante mecanismos de compensação mais eficientes e a criação de uma unidade de referência comum para o comércio, reduzindo a dependência de moedas extrarregionais;
- implementar iniciativas de convergência regulatória, facilitando trâmites e desburocratizando procedimentos de exportação e importação de bens;
- ampliar os mecanismos de cooperação de última geração que envolvam serviços, investimentos, comércio eletrônico e política de concorrência;
- atualizar a carteira de projetos do Conselho Sul-Americano de Infraestrutura e Planejamento (Cosiplan), reforçando a multimodalidade e priorizando os de alto impacto para a integração física e digital, especialmente nas regiões de fronteira;
- desenvolver ações coordenadas para o enfrentamento da mudança do clima;
- reativar o Instituto Sul-Americano de Governo em Saúde, que permitirá adotar medidas para ampliar cobertura vacinal, fortalecer o complexo industrial da saúde e expandir o atendimento a populações carentes e povos indígenas;
- lançar a discussão sobre a constituição de um mercado sul-americano de energia, que assegure o suprimento, a eficiência do uso de nossos recursos, a estabilidade jurídica, preços justos e a sustentabilidade social e ambiental;
- criar programa de mobilidade regional para estudantes, pesquisadores e professores no ensino superior, algo que foi tão importante na consolidação da União Europeia; e
- retomar a cooperação na área de defesa com vistas a dotar a região de maior capacidade de formação e treinamento, intercâmbio de experiências e conhecimentos em matéria de indústria militar, de doutrina e políticas de defesa.
Confira como foi a fala do presidente na abertura da cúpula de países sul-americanos:
Além de Lula, 10 chefes de Estado participam da programação. A única ausência é da presidente do Peru, Dina Boluarte, impossibilitada de deixar o país por motivos internos. Veja os nomes:
- Alberto Fernández (Argentina)
- Luís Arce (Bolívia)
- Gabriel Boric (Chile)
- Gustavo Petro (Colômbia)
- Guillermo Lasso (Equador)
- Irfaan Ali (Guiana)
- Mário Abdo Benítez (Paraguai)
- Chan Santokhi (Suriname)
- Luís Lacalle Pou (Uruguai)
- Nicolás Maduro (Venezuela)
- Alberto Otárola, presidente do Conselho de Ministros (Peru)
Segundo o Itamaraty, a proposta do encontro é promover um diálogo franco entre os líderes, com objetivo de identificar denominadores comuns, discutir perspectivas para a região e reativar a agenda de cooperação sul-americana em áreas-chave.
São elas: saúde, mudanças climáticas, defesa, combate aos ilícitos transnacionais e infraestrutura e energia, entre outras.
Programação
Durante o dia, o evento contará com duas sessões no Itamaraty. Durante a manhã, os líderes estrangeiros foram recebidos pelo presidente Lula e, na sequência, fizeram discursos de abertura. As declarações dos chefes de Estado ocorreram a portas fechadas.
Na parte da tarde, está prevista uma conversa mais informal, em formato reduzido, em que cada mandatário será acompanhado pelo respectivo chanceler e apenas um ou dois assessores.
À noite, os chefes de Estado e as delegações participarão de um jantar oferecido pelo presidente Lula e pela primeira-dama, Janja da Silva, no Palácio da Alvorada.