Pesquisadores identificam animal híbrido misterioso no RS

Animal foi encontrado em 2021 e analisado geneticamente; ele é resultado de uma cruza de cão macho com uma graxaim-do-campo fêmea

atualizado 08/09/2023 13:12

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imagem colorida animal hibrido rio grande do sul FLÁVIA FERRARI

Um animal encontrado atropelado em uma estrada no município de Vacaria, no Rio Grande do Sul, intrigou pesquisadores e movimentou uma equipe para descobrir a origem do bicho misterioso. Inicialmente identificado como uma espécie silvestre, o animal que também se parecia com um cachorro foi vítima de um acidente de trânsito em 2021.

A fêmea foi resgatada pelo biólogo Herbert Hasse Junior e encaminhada para o hospital veterinário da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), onde há profissionais especializados para casos com esse.

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Animal é resultado do cruzamento de um graxaim-do-campo e um cachorro

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Foi realizado um estudo genético para saber a origem do bicho misterioso

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Animal diferente

Ao estudá-lo, a pesquisadora Flávia Ferrari observou que o animal era muito diferente do graxaim-do-campo, uma espécie similar a uma raposa, endêmica da América do Sul, especialmente em áreas da Argentina, do Uruguai, do Paraguai, da Bolívia e da Região Sul do Brasil.

Por isso, o animal foi transferido para o canil, que trata de espécies domésticas. Para a surpresas dos pesquisadores, o comportamento do bicho era silvestre e não se parecia com o de um cachorro. O animal se recusou a comer ração, por exemplo, e se alimentava de pequenos roedores.

Após a descoberta, o animal misterioso foi novamente enviado para o setor de animais silvestres. Conforme os pesquisadores, o bicho comia como um graxaim-do-campo silvestre, mas latia como um cão doméstico, e não tinha espécie identificada. Com tantas dúvida, o geneticista Thales Renato Ochotorena de Freitas, do Instituto de Biociências da UFRGS, foi convocado a dar um parecer.

Para isso, foi feito um estudo genético e cromossômico do animal.

Metade da mãe e metade do pai

Os cromossomos são as estruturas que abrigam todo o material genético de um ser vivo. Eles são herdados diretamente dos genitores – metade da mãe e metade do pai.

Ao ser analisado, o animal apresentou 76 cromossomos, para a surpresa dos pesquisadores. Já que se o bicho atropelado fosse um cachorro doméstico (Canis lupus familiaris), ele teria 78 cromossomos. Caso fosse um graxaim-do-campo (Lycalopex gymnocercus), contaria com 74 unidades dessa estrutura.

O único canídeo que aparece no Rio Grande do Sul com esse número de cromossomos é o lobo-guará (Chrysocyon brachyurus), mas os cientistas logo descartaram a ideia de o indivíduo pertencer a esta espécie pelas próprias características físicas dele.

A partir desse trabalho, eles chegaram a uma outra conclusão: o animal não era um cachorro ou um graxaim-do-campo, mas, sim, uma mistura das duas coisas.

Cruzamento

O número inusitado de cromossomos poderia ser explicado pelo cruzamento entre representantes dessas duas espécies. Do cachorro, vieram 39 cromossomos (metade do total). Do graxaim-do-campo, 37. A combinação dos dois chega exatamente aos 76 cromossomos encontrados pelo laboratório gaúcho.

Para confirmar o achado, a bióloga Bruna Elenara Szynwelski, da UFRGS, fez uma análise dos genes do híbrido, que comprovou a linhagem materna do indivíduo de graxaim-do-campo. Ao analisar o DNA completo, os pesquisadores descobriram trechos de genes exclusivos dos cachorros, e outros que só aparecem nos graxains-do-campo.

A partir disso, eles puderam concluir definitivamente que a vítima do atropelamento era um híbrido.

Essa foi a primeira vez que esse fenômeno foi descrito em detalhes na América do Sul — há casos semelhantes registrados com outros canídeos na África, na Europa e na América do Norte.

Os achados, publicados no periódico científico Animals no início de agosto, foram classificados como “raros” e “surpreendentes” pelos envolvidos no trabalho.

Após a recuperação das lesões do atropelamento, o canídeo foi castrado e enviado ao Mantenedouro São Braz, um santuário e zoológico sediado em Santa Maria, também em terras gaúchas.

Registros anteriores

Os envolvidos na investigação suspeitam que esse mesmo animal fora flagrado em outras ocasiões no passado. Em 2019, Hasse Junior, biólogo que resgatou o híbrido, avistou um canídeo de aparência estranha na região de Vacaria. À época, ele gravou um vídeo, e a equipe acredita que se trata do mesmo animal. Isso porque, nos registros obtidos em 2019 e 2021, é possível ver uma mancha branca no tórax de ambos os animais.

Mas a história reservou uma terceira surpresa a todos os envolvidos. Um dia depois da entrevista à BBC News Brasil, realizada em 29 de agosto, os pesquisadores da UFRGS enviaram um email com uma notícia inesperada.

“Assim que terminamos a reunião, ligamos para o santuário [o Mantenedouro São Braz] para solicitar fotos atuais do híbrido”, escreveram os autores do estudo. “Quem atendeu nos informou que o animal morreu há cerca de meio ano.”

Os cientistas confirmaram a informação numa segunda interação via WhatsApp com o mantenedouro, mas ainda estão tentando entender o que causou a morte do animal.

A BBC News Brasil também tentou contato com o Mantenedouro São Braz por meio de mensagens de texto, mas não foram enviadas respostas até a publicação desta reportagem.

Enquanto ainda tentam descobrir o que está por trás da morte do híbrido, os especialistas envolvidos com a história avaliam os possíveis impactos que os cruzamentos entre espécies de canídeos podem ter.

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