Na semana passada, o presidente Lula se afirmou como um líder mundial graças ao seu carisma e às características do Brasil, mas as lideranças duram pouco se não são cuidadas em ambiente de coerência. Os assessores próximos ao presidente precisam alertá-lo dos riscos de ações nacionais incoerentes com os discursos internacionais.
Ao mesmo tempo do seu discurso em Paris, com defesa do meio ambiente e contra a desigualdade social, o presidente Lula patrocinou subsídios fiscais, no valor de R$600 milhões, para induzir venda de automóveis. Medida positiva para dinamizar a economia, mas que vai na direção contrária à fala, ao promover aumento no número de veículos que acentuarão as mudanças climáticas e agravarão a concentração de renda, ao transferir recursos públicos para parcelas da população não-pobre. Este sacrifício fiscal, dirigido aos compradores de carro, corresponde ao custo anual de 100 mil alunos de família com baixa renda na escola pública.
Pode-se argumentar que este subsídio talvez não represente um custo em sua totalidade, porque a demanda poderia não se realizar plenamente sem os incentivos oferecidos, mas parte significará sacrifício fiscal em um país com fortes restrições orçamentárias e com serviços públicos sem qualidade.
Qualquer que seja a correção econômica, esta política interna se choca com o discurso internacional do presidente, criticando os ricos do mundo pela crise ecológica e pela concentração de renda. Ele precisa ser alertado do risco que sua liderança internacional corre, cada vez que sua prática interna se choca com o discurso externo.
Cristovam Buarque foi senador, governador e ministro