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Hora da onça beber água (por Antônio Carlos de Medeiros)

Aprovação da meta fiscal será o primeiro teste importante para conferir o tamanho da base aliada do governo Lula

atualizado 20/04/2023 23:58

Rafaela Felicciano/Metrópoles

O novo arcabouço fiscal vai precisar de 257 votos na Câmara Federal e 41 votos no Senado, para ser aprovado. É hora da onça beber água. Será o primeiro teste importante para conferir o tamanho da base aliada do governo, ainda em construção.

O busílis da âncora fiscal é tornar efetivo o aumento de receitas, com a retirada ou diminuição de benesses fiscais. Isto significa, na prática, enfrentar o vespeiro do conflito distributivo. Trata-se da distribuição de privilégios e incentivos a setores selecionados, prática recorrente e cumulativa. O ministro Haddad identifica quase R$ 600 bilhões de renúncia fiscal no Orçamento: “o Brasil não aguenta mais tanta sangria”.

Quando diz que pretende harmonizar a responsabilidade fiscal com a responsabilidade social, é a esse vespeiro que o ministro Haddad se refere. Que ele traduz assim: “colocar o pobre no orçamento e cobrar impostos dos ricos”. Não vai ser fácil. A herança patrimonialista que a colonização portuguesa legou ao Brasil continua firme e forte. O Orçamento está cheio de jabutis.

O arcabouço é apenas um primeiro passo, de natureza conjuntural, da nova Política macroeconômica do país. O segundo passo, mais estrutural, é a reforma tributária, a ser enviada ao Congresso na sequência. É com ela que o governo pretende retirar o caráter regressivo do sistema tributário, concentrador de renda. E, ao mesmo tempo, estimular a produtividade e o crescimento econômico.

A âncora e a reforma são condições necessárias, mas não suficientes, para o equilíbrio interno no Brasil, contribuindo para a estabilidade política e para a coesão social. Elas precisam ser vistas e tratadas como pré-requisitos para um desafio mais amplo: a pactuação de um novo projeto de desenvolvimento para o Brasil.

Entrevistado há poucos dias por Kennedy Alencar, José Dirceu foi cirúrgico: “o Brasil precisa de um novo Acordo Nacional”.

Um acordo, segundo ele, envolvendo “o governo, o Congresso e o empresariado”, na direção da criação de consenso e equilíbrio interno para um projeto nacional de “fazer 100 anos em 10”.

Este equilíbrio interno permitiria ao Brasil tirar proveito efetivo da crise geopolítica externa, que abre um leque de oportunidades para o país configurar novo projeto de desenvolvimento e reindustrialização, com forte ênfase em educação e ciência e tecnologia.

Dirceu explica que este projeto não é só do PT. “Estou pensando num governo de Frente Ampla para reformas, com a mesma configuração do segundo turno de 2022”.

Neste contexto, de equilíbrio interno e coesão social, a inserção internacional do presidente Lula poderia ser mais efetiva. Dirceu também constata que o capitalismo vive mais um daqueles momentos históricos de impasse, com uma crise de subconsumo. Precisa se “auto-reformar”.

É nesta conjunção histórica que o Brasil pode assumir o seu lugar, mas antes precisa fazer o dever de casa, conclui ele.

*Pós-doutor em Ciência Política pela The London School of Economics and Political Science.

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