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A Conferência das mineradoras sobre a Amazônia (por Felipe Sampaio)

I Conferência Internacional Amazônia e Novas Oportunidades

atualizado 31/08/2023 3:51

mineração na amazônia Igo Estrela/Metrópoles

Quando contei à minha filha Gabriela que eu estaria exatamente hoje em Belém para a I Conferência Internacional Amazônia e Novas Oportunidades ela quis saber o que se pode esperar, em termos de novidades reais e de resultados concretos, em mais esse evento que se dispõe a tratar da vida amazônica (e consequentemente da vida global).

A Gabi acertou no alvo ao disparar sua provocação, levando-se em conta, por exemplo, os desdobramentos de 27 conferências do clima e 15 conferências da biodiversidade, para mencionar apenas as reuniões de cúpula das Nações Unidas sobre o tema nas décadas recentes.

Acostumada a surfar em Recife, ela compreende com clareza as variadas possibilidades presentes na convivência com a natureza. Do alto das ondas, tem um ângulo de observação privilegiado sobre as belezas do mar, os riscos naturais (como os tubarões abundantes na área) e a pegada ambiental humana (como o lixo que todo dia vem agarrado na sua prancha).

A frustração e a impaciência da Gabi são geracionais. Jovens nascidos a partir dos anos 1990 convivem com o debate intenso sobre o aquecimento global e sentem literalmente na pele os efeitos crescentes da mudança climática (o grau UVB no protetor solar dos surfistas não para de aumentar). Sabem que seus filhos sofrerão na prática fenômenos como inundações, secas, dificuldades de acesso a água e alimentos, conflitos, migrações forçadas, crises energéticas, entre outras.

Assim como tantos outros eventos e atividades já ocorridos anteriormente na Amazônia, ou sobre a Amazônia, a conferência que ocorre agora provavelmente não poderá prometer resultados efetivos relevantes que tranquilizem (ou, ao menos, animem) uma surfista antenada de 25 anos. Devo confessar que também não é isso que espero encontrar nas discussões de hoje em Belém.

Contudo, há um caráter inovador inegável na I Conferência Internacional Amazônia e Novas Oportunidades. Pela primeira vez na Terra da Santa Cruz um evento desse porte não será realizado pelo governo ou por algum organismo multilateral. Dessa vez, é um setor econômico crítico (e poderoso) que está idealizando e bancando o debate franco e amplo sobre a Amazônia e a mudança climática.

Como se não bastasse, o setor em questão é a mineração que, ao lado do agronegócio e dos bancos, constitui aquela tríade capitalista mais criticada quando o assunto é justamente o desenvolvimento socioambiental sustentável.

Ainda não será dessa vez que Gabi verá os amazônidas, especialmente os povos originários e a população mais vulnerável, protagonizando as discussões. Sua geração não é do tipo que se impressionará nem mesmo com as palestras do ex-premiê britânico Tony Blair ou do ex-secretário geral da ONU Ban Ki-Moom. Mesmo assim, o Instituto Brasileiro de Mineração IBRAM merece reconhecimento pela iniciativa.

Presidida pelo ex-ministro Raul Jungmann, a entidade proporciona um avanço real e dá um exemplo corajoso ao posicionar as principais mineradoras multinacionais como anfitriãs do debate qualificado sobre clima e desenvolvimento humano, em pleno coração da Amazônia, especialmente no momento em que o mundo pergunta quanto custará e quem pagará a conta da mitigação e das adaptações climáticas.

Seja como for, cada qual a seu modo, tanto Gabi quanto o IBRAM estão de parabéns.

 

Felipe Sampaio: chefiou as assessorias dos ministros da Defesa e da Segurança Pública; cofundador do Centro Soberania e Clima; foi secretário-executivo de Segurança Urbana do Recife; atual diretor do SINESP no Ministério da Justiça e Segurança Pública.

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